instituto projetos ambientais, em revista

Ciência e Sustentabilidade


Uma vez que a característica mais marcante da biosfera é sua capacidade intrínseca de sustentar a vida, uma comunidade humana sustentável tem de ser projetada de tal modo que seus modos de vida, suas atividades, sua economia, suas estruturas físicas e suas tecnologias não prejudiquem de modo algum essa capacidade intrínseca da natureza.

Essa definição implica em que o primeiro passo da caminhada rumo à construção de comunidades sustentáveis é a aquisição de uma educação ecológica – da nossa capacidade de compreender os princípios básicos da ecologia e viver de acordo com eles. Isso significa que a educação ecológica tem de tornar-se uma qualificação essencial dos políticos, líderes empresariais e profissionais de todas as esferas, e tem de ser, em todos os níveis, a parte mais importante da educação – desde as escolas primárias e secundárias até as faculdades, as universidades e os institutos de educação continuada e de formação profissional.
É preciso ensinar aos nossos filhos os fatos fundamentais da vida – que os resíduos deixados por uma espécie viva servem de alimento para outra espécie; que a matéria circula continuamente pela teia da vida; que a energia motriz dos ciclos ecológicos vem do sol; que a diversidade é a garantia da capacidade de resistir aos imprevistos; que a vida, desde o momento em que surgiu há mais de três bilhões de anos, não tomou conta do Planeta pelo combate, mas pela organização. (ver sobre Ecologia Profunda)
A educação ecológica é o primeiro passo em direção à Sustentabilidade. O segundo passo é a passagem da educação ecológica (ecoliteracy) para o projeto ecológico (ecodesing). Precisamos aplicar nossos conhecimentos ecológicos à redefinição fundamental das nossas tecnologias e instituições sociais, de modo a transpor o abismo que atualmente separa os projetos humanos dos sistemas ecologicamente sustentáveis da natureza.

O projeto em seu sentido mais amplo é a moldagem dos fluxos de energia e matéria em vista das finalidades humanas. O projeto ecológico é um processo pelo qual as finalidades humanas são cuidadosamente inseridas no contexto maior dos padrões e fluxos do mundo natural. Os princípios do projeto ecológico refletem os princípios de organização que a natureza desenvolveu para sustentar a teia da vida.

Toda e qualquer proposta realista de mudar o ideário (virar o jogo) tem de partir do princípio de que a forma atual de globalização econômica fi concebida conscientemente e, por isso, pode ser reformulada. O chamado “mercado global” não passa, na realidade, de uma rede de máquinas programadas segundo o princípio fundamental de que o ganhar dinheiro deve ter precedência sobre os direitos humanos, a democracia, a proteção ambiental e todos os demais valores. O problema não é tecnológico, mas político.

A prática do desenho industrial num contexto como esse exige uma mudança fundamental de nossa atitude em relação à natureza: deixar de pensar no que podemos extrair da natureza e começar a pensar no que podemos aprender com ela.

Nesses últimos anos o número de práticas e projetos de base ecológica aumentou muito, e todos eles bem documentados. Entre eles, podemos mencionar a ressurreição da agricultura e da pecuária orgânicas em escalas mundias; a coordenação de diversas indústrias em agrupamentos ou conglomerados ecológicos, nos quais os resíduos de uma empresa servem de matéria-prima para outra; a passagem de uma economia de produção para uma economia de ‘serviços e fluxos’, na qual as matérias-primas e componentes técnicos industriais circulam continuamente entre os fabricantes e usuários.
Podemos incluir também a criação de edifícios que, sem os esquemas convencionais de aquecimento e refrigeração, têm um conforto ambiental perfeito e podem até gerar mais eletricidade do que utilizam; o desenvolvimento de automóveis elétricos híbridos que chegam a percorrer mais de 35 quilômetros com um litro de combustível e são mais seguros e confortáveis que os automóveis convencionais; e a elaboração de eficientes células de combustível movidas a hidrogênio que nos acenam com a possibilidade de uma nova era na produção energética – uma economia de hidrogênio. A célula de combustível é um aparelho eletroquímico que combina hidrogênio e oxigênio para produzir eletricidade e água – e mais nada!

À medida que formos entrando nessa nova economia do hidrogênio, sua eficiência energética será tão superior à dos combustíveis fósseis que até mesmo o petróleo mais barato perderá a sua competitividade e não valerá mais o custo da extração.

Para concluir, quero lembrar a vocês dos dois fenômenos que terão um efeito decisivo sobre nosso bem-estar e nossos futuros modos de vida: a ascensão do capitalismo global e a criação de comunidades sustentáveis baseadas na prática do projeto ecológico. Essas duas possibilidades – ambas as quais envolvem redes complexas e tecnologias avançadas especiais – encontram-se atualmente em rota de colisão.

Fritjof Capra (Físico e ecologista)
Partes do texto “Uma ciência para a vida sustentável” In: Revista Eco21 Ano XIII N. 75 – Fevereiro de 2003 – http://www.eco21.com.br/

Crédito Foto: http://rebobine.wordpress.com/category/design/page/2/

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